segunda-feira, 29 de outubro de 2012

ANEURISMA DA AORTA ABDOMINAL - DEZ PONTOS A SEREM LEMBRADOS

   Em poucas situações na medicina, uma intervenção preventiva tem um impacto tão grande na modificação da história natural de uma doença, como nos aneurismas de aorta abdominal (AAA) localizados abaixo da emergência das artérias renais (infrarrenais), não somente por sua alta prevalência (90% a 95% de todos os casos de aneurismas de aorta), mas também pelo aumento de complicações e risco de morte que acompanham a correção de urgência (risco de morte 10 vezes maior do que na cirurgia programada).
   Para o estabelecimento de consensos para indicações de reparo eletivo dos AAA, no sentido de substanciar uma tomada de decisão, alguns aspectos sobre comportamento desta patologia devem ser considerados:
   1- Aneurismas abdominais são encontrados incidentalmente com frequência, sobretudo na população idosa. Vários estudos têm estimado que AAA são encontrados em 2% dos indivíduos aos 60 anos, e em cerca de 5% das pessoas com idade superior a 70% anos, sendo 2 a 3 vezes mais comum no homem do que na mulher.
   2- A associação de AAA com algumas doenças é conhecida e relativamente previsível: sabe-se que AAA podem ser encontrados em torno de 5% dos pacientes com aterosclerose coronária, em 9% nos casos de arteriopatia periférica, e em 30 a 50% dos pacientes com aneurismas poplíteos ou femorais.
   3- AAA são facilmente detectáveis pelo exame clínico e por métodos diagnósticos não invasivos. Em linhas gerais, um examinador experiente pode palpar diretamente aneurismas a partir de 5 cm de diâmetro, mas a precisão do diagnóstico somente pela palpação é inferior a 50%, ao passo que a ultrassonografia é hábil em diagnosticar AAA de qualquer diâmetro em 100% dos casos.
   4- A ruptura dos AAA é considerada um problema de saúde pública de grande magnitude, estimando-se em 15.000 óbitos ao ano nos Estados Unidos, os casos que conseguem chegar ao hospital, e talvez o dobro ou triplo deste número se incluídos todos os casos de morte súbita por AAA que ocorrem fora do ambiente hospitalar.
   5- A ruptura dos AAA é mais relacionada a aneurismas grandes, de crescimento rapidamente progressivo ou com início recente de sintomas. Estima-se que o risco de ruptura em 5 anos para aneurismas com menos de 5 cm de diâmetro seja inferior a 5%, enquanto nos aneurismas maiores de 5 cm o risco acumulado se eleva para 25% a 43%.A análise de alguns estudos identificou como maiores preditores de risco para ruptura a expansão rápida do AAA, e a presença de dor abdominal ou lombar significante, independente do tamanho do AAA.
   6- Aneurismas pequenos crescem com velocidade variável: embora estime-se que a média de expansão dos AAA deva ser de 0,4 cm/ano, existe uma grande variabilidade que torna impossível predizer a evolução em um indivíduo específico.
   7- O risco de morte ou complicações maiores com a cirurgia eletiva dos AAA é dependente da experiência do grupo cirúrgico e do volume cirúrgico do hospital, mas na era recente a mortalidade deve ser inferior a 5%. Embora estudos e registros recentes apontem uma mortalidade média de 3,5%, uma variação de até 10% pode ser observada entre cirurgiões ou entre instituições médicas.
   8- A presença de sintomas nos AAA é indicação cirúrgica consensual, independente do diâmetro, e incluem dor/desconforto lombar ou abdominal, embolização distal ou manifestações de compressão de estruturas vizinhas. Obviamente a cirurgia de emergência é mandatória nos casos suspeitos de ruptura.
   9- Também aneurismas de causa inflamatória têm indicação de correção eletiva independente das dimensões, por se acompanharem de manifestações sistêmicas significantes, como febre e emagrecimento.
   10- Em relação ao tratamento, os recentes Guidelines da American Association for Vascular Surgery e da Society for Vascular Surgery, sugerem que: 1) Pacientes assintomáticos de baixo risco devem ser considerados para cirurgia eletiva com diâmetro mínimo de 5,5 cm (em mulheres o diâmetro pode ser de 5,0 cm); 2) Casos de risco perioperatório significativo com 6,0 cm de diâmetro; 3) O manejo clínico ótimo deve incluir controle da hipertensão arterial e o abandono do fumo; 4) A terapia endovascular (implante de endoprótese) passa a ser uma alternativa válida em pacientes de alto risco cirúrgico e/ou com anatomia favorável; 5) O real benefício do tratamento endovascular de aneurismas pequenos não encontra-se ainda demonstrado, enquanto o papel da terapia endovascular no manejo de aneurismas rotos poderá modificar a alta mortalidade destes pacientes, quando submetidos à cirurgia convencional (aberta).
   Fonte: Diretrizes para o tratamento cirúrgico das doenças da aorta da Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular.
   Matéria do Dr. Luiz Fernando Kubrusly - Cirurgião Cardiovascular - Curitiba/Paraná.
   Publicado com autorização do autor.

sábado, 13 de outubro de 2012

DILEMAS DO TRATAMENTO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL NO OCTAGENÁRIO

   Um quarto dos americanos terão mais de 80 anos, em 2030, e a hipertensão estará onipresente nesta faixa etária. Esse aumento da longevidade é parcialmente explicado pelas melhorias nos tratamentos das doenças crônicas, especialmente a hipertensão. Um contínuo aumento da pressão arterial sistólica (PAS), com aumento da idade, já estar bem documentado em ambos os sexos , raças e etnias.
   A maioria dos estudos sobre hipertensão excluir octogenários, e não se deve generalizar os seus resultados devido as suas diferenças fisiológicas e social. A hipertensão já está bem caracterizada em adultos jovens e idosos, e agora o foco está na otimização dos regimes de tratamento. No entanto, as pesquisas envolvendo especificamente essa minoria que cresce rapidamente é escassa. A maioria dos estudos ainda estão tentando caracterizar as metas de pressão arterial (PA), e apenas uma série de grandes começou a avaliar as opções de tratamento. Com base nas evidências disponíveis, parece que uma meta de PA adequada pode ser um pouco maior em octogenários e que os diuréticos tiazídicos podem ser o tratamento inicial de escolha.
   As decisões sobre o tratamento da hipertensão em octogenários são extrapoladas a partir de dados coletados de pacientes que são muito mais jovens. Isto resultou em um campo vago e conflitantes de evidências que são difíceis de se tirar conclusões confiáveis. Questões não resolvidas persistem em relação a quem tratar, quando iniciar e parar o tratamento, e a eficácia relativa dos diferentes classes de drogas. Há uma grande necessidade de se saber, se em alguma idade, a hipertensão deixa de ser um fator de risco para os resultados adversos, e se o tratamento agressivo continua a ser benéfico. Embora a hipertensão seja normalmente tratada com medicação, isso pode não ser a melhor opção para os octogenários que são com frequência intolerantes a agentes atuais. Modificações do estilo de vida, tais como a cessação do tabagismo, exercício e baixa ingestão de sódio podem desempenhar um forte papel na redução da PA neste grupo. 
   Além disso, novas abordagens de intervenções para controle da pressão arterial estão em ascensão. Um tratamento experimental, é um gerador de impulsos implantável subcutâneo, que estimula os barorreceptores das carótidas, levando a uma diminuição na PA, através da ativação do sistema nervoso parassimpático. Outra intervenção recente é desnervação simpática renal seletiva, usando um cateter especialmente concebido para ablação dos nervos simpáticos ao longo das artérias renais. Por ablação destas fibras, ocorrem importantes reduções a longo prazo da PA. No entanto, nenhuma destas técnicas foi especificamente avaliada em octogenários e ambas permanecem experimental.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

ESTUDO MOSTRA NÃO HAVER BENEFÍCIO DO USO DE BETABLOQUEADOR NA DAC CRÔNICA.

   Um estudo publicado recentemente  (Journal of  the American  Medical  Association,  published  on line October 2, 2012.), analisou o uso de betabloqueadores (BB) em pacientes com Doença Arterial Coronária (DAC) estável. Ele mostrou não haver benefício no uso de BB em três grupos de pacientes, que foram: portadores de DAC sem história de infarto do miocárdio (IM), aqueles com antecedentes de IM há um ou mais anos, e nos apenas portadores de fatores de riscos para DAC.
   O autor principal, Dr. Sripal Bangalore (New York University School of Medicine, Nova Iorque) disse que o uso de BB na DAC estável baseia-se em estudos pós-IM, ensaios que antecedem as terapias modernas de reperfusão, o que fez com que fosse extrapolado para pacientes com DAC e mesmo aqueles apenas com fatores de risco. Ele salientou que o estudo não foi sobre os pacientes pós enfarte agudo do miocárdio ou naqueles que têm insuficiência cardíaca (IC), o que já há muitos estudos mostrando os benefícios.
   O registro Redução da aterotrombose para a Saúde Contínua (REACH) analisou 44.708 pacientes, 14.043 (31%) tinham antecedentes de IM, 12.012 (27%) tinha DAC documentada, mas sem IM, e 18.653 (42%) apresentavam apenas factores de risco para DAC.
   O desfecho primário do estudo foi composto de morte cardiovascular, IM não fatal ou acidente vascular cerebral (AVC) não fatal. O desfecho secundário foi o resultado primário além de hospitalização por eventos aterotrombóticos ou um procedimento de revascularização, foram acompanhados em média por 44 meses.
   Os pesquisadores concluiram que as taxas de eventos não foram significativamente diferentes em pacientes com versos aqueles sem uso de beta-bloqueador para qualquer um dos desfechos avaliados, mesmo na coorte com IM prévio (16,9% vs 18,6%; hazard ratio [HR] 0,90, p = 0,14 ).
   No grupo DAC sem IM sozinho, o endpoint primário não foi significativamente diferente entre aqueles com versos aqueles sem uso de beta-bloqueador (12,9% vs 13,6%; HR 0,92, p = 0,31). No endpoint secundário os resultados foram piores entre aqueles que usaram betabloqueadores em comparação com aqueles que não o fizeram (OR 1,14, p = 0,01), sendo também o caso do desfecho terciário de hospitalização (OR 1,17, p = 0,01).
   O mesmo se aplica à coorte com fatores de risco sozinho, em que o endpoint primário foi maior entre aqueles que usaram BB do que aqueles que não o fizeram (14,2% vs 12,1%; HR 1,18, p = 0,02), assim como os taxas do desfecho secundário (22,0% vs 20,2%; OR 1,12, p = 0,04), mas não os resultados terciários de IM e AVC.
   Quanto a resposta durante quanto tempo o paciente deve continuar a tomar um BB após um infarto agudo do miocárdio não é realmente conhecida. A partir destes dados, não existe como responder a esta pergunta. Se um paciente após um ano de IM não tolerar mais o beta-bloqueador, por qualquer motivo, não tendo insuficiência cardíaca, os dados sugerem não haver nenhum mal em parar. O que não se deve fazer nos que têm insuficiência cardíaca, aonde este é um medicamento de grande importância e salva vidas. Da mesma maneira que estes dados não embasam a prescrição de BB para aqueles que foram submetidos a intervenção percutânea ou cirúrgica, que não tiveram infarto do miocárdio.
   As mais recentes recomendações da American Heart Association para prevenção secundária, deu aos beta-bloqueadores uma recomendação IIa para longo prazo da terapia e IIb para pacientes com DAC sem IM ou outra doença vascular. A Sociedade Europeia de Cardiologia recomenda a terapia de longo prazo com BB apenas em pacientes com disfunção sistólica ventricular esquerda (classe I).
   É necessário estudos randomizados na era de terapia médica de reperfusão moderna, mesmo em pacientes com infarto prévio, para realmente se definir quem é o melhor para o uso de BB e identificar a duração ótima do tratamento.
Referência: Heartwire